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O respeito e a disciplina que a todos se impõe

24 Jul. 2014 > 09 Nov. 2014

Curadoria
João Paulo Martins

Design expositivo + Design gráfico
Pedro Ferreira e Rita João (Pedrita) + Nuno Caniça

Piso 2

 

 

 

 

 

Esta exposição apresenta uma perspetiva sobre o mobiliário utilizado em edifícios públicos em Portugal, durante quarenta anos de vigência do Estado Novo. Ela nasce de um projeto de investigação que estudou vários arquivos das Obras Públicas e percorreu o país, em busca dos edifícios e dos objetos considerados mais significativos.

A relativa dispersão de responsabilidades no campo do mobiliário para edifícios públicos que se verificava durante a década de 1930 foi seguida pelo esforço para centralizar projetos e encomendas. 
Em 1940, foi criada no Ministério das Obras Públicas a “Comissão para Aquisição de Mobiliário”. Tinha como objetivo conduzir a elaboração de “estudos e aquisições de mobiliário do primeiro estabelecimento destinado a novos edifícios do Estado e outros em que tenham sido realizadas obras de transformação ou ampliações profundas” (Decreto Lei 30.359). 
Na prática, porém, esta comissão partilharia responsabilidades com uma série de outras entidades, na esfera das Obras Públicas ou de outros ministérios, destinadas a promover instalações para determinados programas funcionais. 

A encomenda de mobiliário para uso oficial em Portugal constituiu um estímulo importante para a economia do setor. Contudo, na ação do Estado e dos seus servidores, não encontramos um investimento na qualidade e no rigor nem qualquer estratégia destinada a tornar mais competitiva a indústria nacional, à imagem daquilo que então sucedia em gabinetes oficiais de outros países. 
Invariavelmente, os resultados eram condicionados por um conjunto de problemas, que na época foram denunciados de modo recorrente mas nunca totalmente ultrapassados: a carência de projetistas com formação especializada, a falta de informação sistemática e atualizada, a ineficácia da burocracia para fazer cumprir projetos e selecionar as empresas mais aptas.

Esta relativa falta de ambição ficou expressa na fórmula que resume a principal preocupação dos projetos oficiais de mobiliário. Tratava-se de encenar a imagem do Estado, na sua relação com os cidadãos: imprimir aos edifícios públicos “um mínimo de aprumo, equilíbrio e bom gôsto", materializar “o respeito e a disciplina que a todos se impõe” (DGEMN/ CAM. Relatório, 1950). 

Reunimos nesta exposição cerca de uma centena de peças de mobiliário. Quase sem exceções, esta é a primeira vez que entram num Museu. 
Uma parte destes exemplares encontrava-se ainda em uso. A maioria, porém, fora descartada. Muitos deles são já peças únicas de populações outrora numerosas, agora resgatadas aos armazéns onde estavam depositadas. 
São apresentadas no estado de conservação em que as encontrámos, sem qualquer operação de restauro. As marcas de uso, as cicatrizes, os remédios improvisados, revelam-nos materiais e processos de construção que de outro modo não seriam visíveis. E histórias de vida intensa, de interação com utilizadores, remotos ou recentes.

Os três primeiros núcleos da exposição mostram diferentes orientações estéticas e ideológicas que se materializaram em projetos de mobiliário destinados a edifícios concretos:

1. a atração internacionalista
2. um estado conservador e totalitário
3. com o movimento moderno

O quarto núcleo – móveis-tipo – reúne peças concebidas para cumprir determinados tipos de funções, sem que tivessem um edifício único como destino.
Destacámos obras, móveis, autores e fabricantes, que nos informam sobre os antecedentes e a emergência do design em Portugal; que contribuem para a identificação de momentos de rutura e para a valorização dos seus protagonistas; para reconhecer impasses, insuficiências, inércias – e que oferecem outros tantos argumentos para a sua salvaguarda patrimonial. Pretendemos deixar pistas para outros investigadores, para futuros aprofundamentos, revisões e reavaliações.