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O MUDE inicia a programação desenhada no âmbito de Lisboa, capital ibero-americana da cultura

Em abril o MUDE inicia a programação desenhada no âmbito de Lisboa, capital ibero-americana da cultura. Ao longo de 2017, três exposições olham para o design da Península Ibérica e da América do Sul, Central e México, refletindo sobre a existência de um design ibero-americano, suas características e contributos para a construção de um mundo verdadeiramente global, sustentável e humanista. Falamos de um território muito vasto e plural, com um passado em comum, muito embora vivido de formas distintas, e duas línguas oficiais que aproximam os vários povos, apesar da existência de muitas outras línguas e inúmeros dialetos. Assim, iremos abordar necessariamente as suas representações e imagéticas, tocar alguns estereótipos ou equívocos e procurar afinidades e convergências.
As exposições vão ser também um espaço de reflexão sobre o próprio processo curatorial, uma vez que as várias abordagens, o trabalho das equipas formadas por diferentes gerações de distintos países, a seleção de designers e a organização dos conteúdos evidenciou a carga ideológica das palavras e a persistência de preconceitos, incómodos e leituras divergentes. Mas este mesmo processo demonstrou também a importância deste tempo de reconhecimento, consciencialização e partilha sobre a real proximidade entre todos os países. Os títulos das exposições traduzem esta intencionalidade e testemunham a forma como cada uma tem a sua identidade própria, apesar de terem sido programadas de forma integrada, de modo a problematizar as relações do design dos dois lados do Atlântico Sul, olhando para o passado e perscrutando o presente. Acredito que o valor universalista do design vai ser evidente.
Uma vez que o edifício do MUDE se encontra em obras de requalificação integral durante este ano, havia que encontrar o lugar certo que acolhesse esta programação e recebesse o MUDE FORA DE PORTAS. Graças a uma parceria com a Universidade de Lisboa – IICT/ MUHNAC, as três exposições vão realizar-se no Palácio dos Condes da Calheta, no Jardim Botânico Tropical, em Belém. Esta decisão revelou-se de particular significado, uma vez que o Jardim Botânico acolheu a Secção Colonial da Exposição do Mundo Português, em 1940, e o Palácio - muito representativo da arquitetura civil portuguesa - recebeu, em 1916, o Museu Agrícola Colonial (mais tarde, Museu Agrícola do Ultramar). As salas do andar nobre, onde decorrem as exposições, distinguem-se pelos azulejos historiados, da segunda metade do século XVII até finais do séc. XVIII, com cenas marítimas e militares.
A simples abertura das suas portas poderia constituir por si só um acontecimento de relevo na programação da capital ibero-americana, uma vez que o Palácio está intimamente relacionado com a história ultramarina e a política colonialista de Portugal. Os painéis escultóricos de 1940, a xiloteca, com as madeiras seccionadas e identificadas pela sua designação e proveniência, ou os inúmeros instrumentos, ferramentas artesanais e artefactos das diferentes culturas africanas, do acervo do antigo museu ou provenientes das missões etnográficas realizadas nos territórios das ex-colónias, permitiriam diferentes abordagens. O reconhecimento do valor cultural e antropológico deste espólio seria uma das leituras possíveis, uma vez estarmos perante preciosos registos do quotidiano e exemplos de um design anónimo demonstrativo do modo como o homem sempre procurou unir o útil e o belo. Outra perspetiva seria debater a nossa história colonial, colocando-nos a olhar para o nosso passado recente, com distanciamento e objetividade, sem nostalgias ou ressentimentos. O Palácio Calheta é assim o lugar certo para esta programação, tendo-se afirmado também como um conteúdo expositivo, tal como as obras que temporariamente o vão habitar.
Começamos com a exposição Novo Mundo. Visões através da Bienal Iberoamericana de Diseño. 2008-2016. Olhamos para além do termo eurocêntrico que cunhou os territórios descobertos pelo Velho Mundo, para escutar mais de 100 designers de 22 países, tomar o pulso aos novos processos colaborativos e dar a conhecer projetos que têm vindo a colocar a tónica na partilha de informação e conhecimento, no intercâmbio intergeracional, na coesão social, na inclusão e no multiculturalismo, contribuindo para o desenvolvimento humano e para a sustentabilidade social.
Em Julho, apresentamos Como se Pronuncia Design em Português: Brasil Hoje revelando 100 perspetivas do design do Brasil do século XXI (50 livros + 50 projetos).
E em Outubro, Tanto Mar. Fluxos transatlânticos pelo design propõe uma circum-navegação que envolve alguns países africanos, uma vez que estes fluxos não foram bidirecionais, problematizando a natureza das trocas entre Portugal e Brasil.
Com estas exposições, respetivos catálogos e programas paralelos de visitas e encontros, o MUDE inicia uma linha de programação estratégica que terá novos desenvolvimentos já na Rua Augusta, 24.

Bárbara Coutinho
Diretora e Programadora
MUDE – Museu do Design e da Moda, Coleção Francisco Capelo